quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Da Imitação de Cristo: "Hão-de ver o Filho do Homem vir"

«O Reino de Deus está dentro de vós», diz o Senhor (Lc 17,21). Volta-te com todo o teu coração para o Senhor e deixa este mundo miserável; e a tua alma achará repouso. Aprende a desprezar as coisas exteriores e a entregar-te às interiores, e verás chegar para ti o Reino de Deus. Na verdade, «o Reino de Deus é a paz e a alegria no Espírito Santo» (Rom 14,17), que não é dado aos ímpios. 

Cristo virá junto de ti, mostrando-te a sua consolação, se Lhe tiveres preparado interiormente uma morada digna. Toda a sua glória e beleza são de dentro, e é aí que Ele Se compraz. Ele visita frequentemente o homem recolhido, a sua conversa é doce, a sua consolação agradável, a sua paz imensa, o seu convívio admirável. 

Vai, alma fiel, prepara o teu coração para este Esposo, para que Se digne vir a ti e em ti habitar. Na verdade, Ele diz assim: «Se alguém Me ama, ouvirá a minha palavra, e viremos a ele, e nele faremos morada» (Jo 14,23). […] O homem interior depressa se recolhe, pois nunca se dispersa totalmente nas coisas exteriores. O trabalho exterior não o prejudica, nem as ocupações, por vezes necessárias; mas, tal como sucedem as coisas, assim a elas se acomoda. Aquele que é bem formado e ordenado interiormente não se importa com as acções admiráveis ou perversas dos homens. […] Se renunciares às consolações exteriores, poderás contemplar as coisas do céu e alegrar-te frequentemente em teu coração.

Imitação de Cristo, tratado espiritual do século XV, Livraria Moraes, 1959 
Livro 2, § 1 

Fonte: Evangelho Cotidiano

segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Perdoar 7 vezes ao dia.

Isaac da Estrela (?-c. 1171), monge cisterciense 
Sermão 31: PL 194,1792, SC 207 

«Levai os fardos uns dos outros de outros; assim cumprireis a lei de Cristo»; «Suportai-vos uns aos outros com amor» (Gal 6,2; Ef 4,2): é esta a lei de Cristo. Quando vejo no meu irmão alguma coisa incorrigível, como resultado de dificuldades ou de enfermidades físicas ou morais, porque não suportá-lo com paciência, porque não consolá-lo com todo o coração, segundo a palavra da Escritura: «Os seus filhos serão levados ao colo e consolados sobre os joelhos» (Is 66,12)? Faltar-me-á essa caridade que tudo suporta, que é paciente para apoiar, indulgente para amar (cf 1Cor 13,7)? De qualquer maneira, esta é a lei de Cristo: na sua Paixão, Ele realmente «tomou sobre Si as nossas enfermidades» e, na sua misericórdia, «carregou com as nossas dores» (Is 53,4), amando aqueles que carregava, carregando aqueles que amava. 

Quem, ao contrário, é agressivo para com o irmão em dificuldades, quem o atormenta pelas suas fraquezas, sejam elas quais forem, submete-se obviamente à lei do diabo e executa-a. Sejamos pois compassivos uns com os outros e cheios de amor fraternal; suportemos as fraquezas e lutemos contra os vícios. […] E qualquer tipo de vida que permita entregar-se com mais sinceridade ao amor de Deus e, por Ele, ao amor ao próximo – seja na vida religiosa ou na vida laica – é verdadeiramente agradável a Deus.

sexta-feira, 17 de outubro de 2014

Até os cabelos da vossa cabeça estão contados, não temais

São Rafael Arnaiz Baron (1911-1938), monge trapista espanhol
Escritos espirituais

Deus envia-me a cruz. […] Bendita seja ela porque, como diz Job, «se recebemos os bens da mão de Deus, não aceitaremos também os males?» (2,10) Tudo nos vem dele, saúde e doença, bens temporais, infelicidades e infortúnios: tudo, absolutamente tudo, está perfeitamente ordenado. Se por vezes a criatura se rebela contra o desígnio de Deus, peca, porque tudo é necessário, tudo está bem feito, e os risos são tão necessários como as lágrimas. Podemos tirar proveito de tudo para a nossa perfeição, na condição de vermos, em espírito de fé, a obra de Deus em tudo e de nos colocarmos como crianças nas mãos do Pai. Com efeito, aonde iríamos nós sozinhos? […] 

Não procuro arrancar-me aos sentimentos [que as minhas provações me inspiram], é evidente; mas aquilo que Deus quer é aperfeiçoá-los em mim. Para isso, leva-me por aqui e por ali, como um brinquedo, levando-me a abandonar pedaços do meu coração pelo caminho. Deus é grande e realiza tudo perfeitamente! Como me ama e que mal que eu lhe pago! A sua providência é infinita e devemos confiar-nos a ela sem reservas.

Fonte: Evangelho Cotidiano

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Uma boa medida, cheia, recalcada, transbordante

Jean Tauler (c. 1300-1361), dominicano de Estrasburgo 
Sermão 39 para o 4º Domingo após a Solenidade da Santíssima Trindade 


Nosso Senhor menciona quatro tipos de medidas que serão dadas ao homem: uma boa medida, uma medida cheia, uma medida recalcada e uma medida transbordante. […] Compreendei primeiro o que é a boa medida. Ela consiste no facto de o homem voltar a sua vontade para Deus, viver segundo os mandamentos de Deus e da santa Igreja […], na prática dos sacramentos e no arrependimento dos pecados, no amor a Deus e ao próximo. […] Eis uma vida verdadeiramente cristã […]; pode-se dizer que é o estritamente necessário. […] Quando o homem se inicia na vida espiritual, propõe-se boas práticas exteriores, tais como orações, prostrações, jejuns e outras formas particulares de devoção. Em seguida, é-lhe dada a medida cheia, a saber, um exercício interior, íntimo, pelo qual o homem emprega todo o seu zelo a procurar a Deus nas profundezas do seu coração, pois é aí que está o Reino de Deus (Lc 17,21). Meus filhos, esta vida é tão diferente da primeira como correr é diferente de estar sentado. […] 

Vem em seguida a medida recalcada: é o amor que se difunde. Este amor atrai tudo a si: as boas obras, a vida, o sofrimento. Ele traz para o seu vaso todo o bem que se faz no mundo, quer seja feito pelos bons ou pelos maus […]; tudo está na caridade. […] O amor absorve todo o bem que há no céu, nos anjos e nos santos, nos sofrimentos dos mártires, e atrai para si tudo o que há de bom nas criaturas do céu e da terra, de que uma parte tão grande se perde, ou pelo menos parece perder-se; mas a caridade não a deixa perder. […] 

Vem em seguida a medida transbordante. Esta medida está tão cheia, é tão abundante, tão generosa, que transborda por todos os lados. Nosso Senhor toca o vaso com um dedo e logo a plenitude dos dons sobe rapidamente, ultrapassando tudo o que o vaso havia recolhido em si e acima de si. […] Tudo se difunde e tudo se perde em Deus e se torna um com Ele. Deus ama-Se nesses homens, opera todas as suas obras neles. […] É assim que a medida dos corações transbordantes se difunde por toda a Igreja.

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Nossa Senhora Consolata ou Consoladora dos Aflitos.



A devoção para com Nossa Senhora Consolata (ou Consoladora dos Aflitos) surgiu em Turim (norte da Itália), na metade do século V. Segundo uma tradição alicerçada em sólidos fundamentos, o quadro de Nossa Senhora Consolata foi trazido da Palestina por Santo Eusébio, Bispo de Vercelli, que o doou a São Máximo, Bispo de Turim. São Máximo, por sua vez, no ano 440, expôs o quadro à veneração dos fiéis de Turim, num altarzinho erguido no interior da igreja do Apóstolo Santo André.

O povo, a convite do seu Bispo, começou a venerar a efígie daquele quadro com grande fé e devoção. E Maria começou a distribuir muitas graças, inclusive graças extraordinárias, sobretudo em favor das pessoas doentes e sofredoras. Sensibilizados com o amor misericordioso da Virgem Maria, o Bispo e o povo começaram então a invocá-la com os títulos de “Mãe das Consolações”, “Consoladora dos Aflitos”, e “Consolata” (Consolata é a forma popular de Consoladora).

O quadro de Nossa Senhora Consolata permaneceu exposto à veneração dos fiéis sem sofrer nenhum transtorno, durante quatro séculos consecutivos.
Por volta do ano 820 penetrou na cidade de Turim a funesta heresia dos iconoclastas (pessoas que quebravam e destruíam toda e qualquer imagem ou quadro religioso expostos ao culto). Em tal circunstância, temendo que o quadro da Consolata fosse destruído, os religiosos que tomavam conta da igreja de Santo André resolveram tirá-lo do altar do oratório e escondê-lo nos subterrâneos da igreja, esperando que passasse a onde devastadora dos iconoclastas. Mas a perseguição se prolongou por longos anos. As pessoas que haviam escondido o quadro morreram sem revelar o lugar do seu esconderijo. Assim, o quadro ficou desaparecido pelo espaço de um século. Este facto fez com que os fiéis deixassem de frequentar o oratório e perdessem, aos poucos, a lembrança da Virgem Consoladora.

Mas a Divina Providência velava. No ano 1014, Nossa Senhora apareceu a Arduíno, Marquês de Ivréia, gravemente enfermo, e pediu-lhe que construísse três capelas em sua honra: uma em Belmonte, outra em Crea e a terceira em Turim, esta última junto às ruínas da antiga igreja de Santo André, cuja torre ainda permanecia de pé. O Marquês Arduíno milagrosamente curado por Nossa Senhora, logo mandou construir as três capelas.

Ao fazerem as escavações para os alicerces da capela de Turim, os operários encontraram no meio dos escombros o quadro de Nossa Senhora Consolata, ainda intacto, apesar de ser uma pintura em tela. O facto encheu de alegria a população da cidade e a devoção à Mãe das Consolações renasceu mais forte que antes. Parecia que nunca mais se apagaria, mas não foi assim. 

As numerosas guerras, as frequentes epidemias que assolavam a região, as invasões, etc., fizeram que muitos habitantes de Turim abandonassem a cidade; com tal situação, a igreja de Santo André e a capela de Nossa Senhora Consolata foram desmoronando aos poucos e tudo acabou novamente num monte de escombros. E o quadro da Consolata, mais uma vez, ficou mergulhado nas ruínas pelo espaço de 80 anos...

Deus intervém de novo, e de forma extraordinária. Em 1104 um cego de Briançon (pequena cidade da França), chamado João Ravache, teve uma visão de Nossa Senhora; a Virgem Maria prometeu devolver-lhe a luz dos olhos se fosse a Turim visitar a sua capela que jazia em ruínas... Lutando contra muitas dificuldades o cego chegou a Turim. O Bispo da cidade, Mainardo, acolheu e ouviu o cego; ciente de que se tratava de um facto real, mandou fazer as escavações no local mencionado pelo cego, de acordo com a indicação que Nossa Senhora lhe dera durante a visão. No dia 20 de Julho de 1104, o quadro da Consolata foi reencontrado sob as ruínas, ainda intacto. O cego, conduzido à presença do quadro, recuperou instantaneamente a vista. O numeroso povo que presenciara ao fato rompeu em brados de alegria. O Bispo Mainardo, comovido, ergueu repetidas vezes esta invocação a Nossa Senhora: “Rogai por nós, Virgem Consoladora!” E o povo respondeu: “Intercedei pelo vosso povo!” 

Este episódio consolidou na alma do povo de Turim a devoção para com Nossa Senhora Consolata. A profunda confiança dos fiéis na poderosa protecção da Mãe das Consolações foi sobejamente premiada ao longo dos séculos. 

Hoje, depois de 15 séculos, no local do primeiro oratório, surge o devoto santuário da Consolata, que se tornou o coração mariano de todo o norte da Itália. Foi junto àquele santuário que, no primeiro decénio do século XX, o Beato José Allamano fundou o Instituto dos Missionários e das Missionárias da Consolata. Actualmente, a devoção de Nossa Senhora Consolata é conhecida em muitos países de vários continentes.

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Peçamos aos apóstolos

São Jerónimo (347-420), presbítero, tradutor da Bíblia, doutor da Igreja 




Cristo médico

«A sogra de Simão estava de cama com muita febre.» Possa Cristo vir a nossa casa, entrar e curar com uma só palavra a febre dos nossos pecados. Todos nós temos febre. De cada vez que nos encolerizamos, ficamos com febre; todos os nossos defeitos são outros tantos acessos de febre. Peçamos aos apóstolos que intercedam junto de Jesus, para que Ele Se aproxime de nós e nos tome pela mão; pois logo que Ele nos tome pela mão a febre desaparecerá. 

É Ele o verdadeiro, o grande médico, o primeiro de todos os médicos. Moisés é um médico, Isaías e todos os santos são médicos; mas Jesus é o primeiro de todos os médicos. Ele sabe perfeitamente tomar o pulso e sondar os segredos das doenças. Não toca na orelha nem na fronte, nem em nenhuma outra parte do corpo, mas agarra na mão […], isto é, nas obras más. Primeiro cura as obras e depois a febre desaparece.

Homilias sobre o evangelho de Marcos, nº 2C; PLS 2, 125s, SC 494 


quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Tem paciência comigo

São João Crisóstomo, Doutor da Igreja
Homilias sobre o Evangelho de Mateus, nº 61

Cristo pede-nos duas coisas: que condenemos os nossos pecados e perdoemos os dos outros; e que façamos a primeira por causa da segunda, que nos será então mais fácil, pois aquele que pensa sobre os seus pecados será menos severo para com os seus companheiros de miséria. E que não perdoemos apenas com a boca, mas do fundo do coração, para não voltarmos contra nós próprios o ferro com que pensamos trespassar os outros. Que mal pode fazer-te o teu inimigo, em comparação com o que podes fazer a ti próprio com o teu azedume? […] 

Considera pois quantas vantagens retiras duma ofensa acolhida com humildade e mansidão. Desse modo, em primeiro lugar — e é o mais importante —, mereces o perdão dos teus pecados. Seguidamente, exercitas a paciência e a coragem. Em terceiro lugar adquires a mansidão e a caridade, pois aquele que é incapaz de se zangar com os que lhe fizeram mal será ainda mais caridoso com os que o amam. Em quarto lugar, arrancas totalmente a cólera do teu coração, o que é um bem incomparável; evidentemente, aquele que liberta a sua alma da cólera também se desembaraça da tristeza: não desperdiçará a sua vida em tristezas e vãs inquietações. É que nós punimo-nos a nós próprios quando odiamos os outros; só fazemos bem a nós próprios quando os amamos. Além disso, todos te respeitarão, mesmo os teus inimigos, ainda que sejam os demónios. Melhor ainda, se assim te comportares, até deixarás de ter inimigos.

terça-feira, 5 de agosto de 2014

São cegos a conduzir outros cegos

João Escoto Erígena (?-c. 870), beneditino irlandês 
Homilia sobre o prólogo do evangelho de S. João, 11 


Santo teólogo [São João], primeiro chamaste «Verbo», «Palavra de Deus» ao Filho de Deus; depois chamaste-Lhe «vida» e «luz» (1,1.4). Foi com toda a propriedade que mudaste os seus nomes, para nos fazer compreender significações diferentes. Nomeaste-O «Verbo», porque foi por Ele que o Pai disse todas as coisas, e disse e tudo foi feito (Sl 33,9). Nomeaste-O «luz e vida» porque o Filho é também a luz e a vida de todas as coisas que foram feitas por Ele. O que é que Ele ilumina? Nada mais que Ele próprio e seu Pai […]: ilumina-Se a Si mesmo, dá-Se a conhecer ao mundo, manifesta-Se aos que não O conhecem. Essa luz do conhecimento de Deus havia deixado o mundo, quando o homem abandonou Deus. 


A luz eterna revela-Se ao mundo de duas maneiras, pela Escritura e pela criação (Sl 18; Rm 1,20). O conhecimento de Deus só se renova em nós pelos textos da Escritura santa e pela visão da criação. Estudai as palavras de Deus e recebei em vosso coração o que elas significam: aprendereis a conhecer o Verbo. Percebei pelos vossos sentidos corporais as formas magníficas das coisas acessíveis aos nossos sentidos, e nelas reconhecereis Deus, o Verbo. Em todas estas coisas, a verdade nada mais vos revelará que o próprio Verbo, que tudo fez (Jo 1,3); nada podeis contemplar fora dele, porque Ele é todas as coisas. Ele está em todas as coisas que existem, quaisquer que sejam.

sexta-feira, 1 de agosto de 2014

Não é Ele o filho do carpinteiro?

Santo Agostinho de Hipona 
Sermão 51, §§ 19.30

A resposta do Senhor Jesus: «Não sabíeis que devia estar em casa de meu Pai?» (Lc 2,49) não afirma que Deus é o seu Pai para significar que José não o é. Como provar isso? Pela Escritura, que continua: «Depois desceu com eles, voltou para Nazaré e era-lhes submisso» (v. 51). A quem era Ele submisso? Não era a seus pais? Portanto, eram ambos seus pais. […] Eram seus pais no tempo e Deus era seu Pai desde toda a eternidade. Eles eram os pais do Filho do Homem; o Pai era-o da sua Palavra, do Verbo, da sua Sabedoria (cf 1Cor 1,24), esse poder pelo qual criou todas as coisas. 

Não nos surpreendamos pois por os evangelistas nos darem a genealogia de Jesus por via de José ao invés de o fazerem por via de Maria (cf Mt 1,1; Lc 3,23). Se Maria se tornou mãe fora dos desejos da carne, José tornou-se pai fora de uma união carnal; desse modo, pôde ser o ponto de partida da genealogia do Salvador, mesmo não sendo seu pai segundo a carne. A sua grande pureza confirma a sua paternidade. Maria, sua esposa, quis chamar-lhe assim: «Olha que teu pai e eu andávamos aflitos à tua procura!» (Lc 2,48) […] 

Se Maria deu à luz o Salvador para além de todas as leis da natureza, o Espírito Santo também actuou em José, actuando em ambos de modo igual. «José era um homem justo», diz o evangelista Mateus (1,19). O marido era justo, sua mulher era justa: o Espírito Santo repousou sobre dois justos e deu um filho a ambos.


sexta-feira, 11 de julho de 2014

São Bento estabeleceu a paz de Cristo na Europa invadida pelos bárbaros

Papa Pio XII
Encíclica «Fulgens radiatur», de 21/03/1947 

Com efeito, enquanto nessa escura e convulsionada época da história o cultivo da terra, o amor do trabalho e da arte, o estudo das ciências e das letras, tanto religiosas como profanas, eram lançados, por uma espécie de desdém geral e sintomático, ao abandono, dos mosteiros beneditinos sai uma plêiade luminosa de agricultores, de artistas, de sábios, que nos salvaram incólumes os monumentos da velha literatura, conciliaram os velhos e os novos povos, em guerras constantes, reduzindo-os da barbárie renascente, das correrias, do saque, à moderação da moral humana e cristã, à abnegação do trabalho, à luz da verdade; reconstituíram, enfim, uma civilização enformada nos princípios do Evangelho. 

Isso, porém, não é tudo. A base, a directriz, por assim dizer, suprema de toda a vida beneditina é que todo trabalho, seja ele qual for, intelectual ou manual, seja, antes de mais, para o monge, veículo que o eleve a Jesus Cristo e centelha que o inflame no seu amor perfeitíssimo. Não podem, com efeito, as coisas da terra, nem do universo, satisfazer as exigências espirituais do homem, que Deus criou para Si. […] Por essa razão, é absolutamente necessário que nada se anteponha ao amor de Cristo, que nada nos seja mais caro que o seu amor, que, numa palavra, nada absolutamente se anteponha a Cristo, que Se digna conduzir-nos à posse da vida eterna. 

A este ardentíssimo amor de Jesus Cristo é necessário que corresponda o amor do próximo, porque a todos, indistintamente, devemos o ósculo fraterno da paz e o tributo solícito do nosso arrimo. Donde, enquanto a intriga e o ódio convulsionavam e lançavam os povos nos campos de batalha e, nessa confusão cósmica dos homens e das coisas, erguiam ao alto o facho sangrento da morte, do roubo, da miséria e das lágrimas, Bento legava a seus filhos este preceito santíssimo: «Ponha-se particular cuidado e solicitude no recebimento dos pobres e viajantes estrangeiros, porque é na pessoa destes que principalmente se recebe a Cristo»; e «todos os hóspedes que se apresentarem no mosteiro se recebam como se fossem Cristo, porque Ele há-de dizer: fui hóspede e recebeste-me» (Mt 25,35). E mais ainda: «antes de tudo, haja o maior cuidado no tratamento dos doentes, sirvam-se com tal diligência como se fossem realmente Cristo, porque Ele disse: estive doente e me viestes visitar» (v. 36).

quinta-feira, 10 de julho de 2014

Proclamai que está próximo o Reino dos Céus

São Boaventura, franciscano, doutor da Igreja

A entrada na Ordem [de S. Francisco] de mais um homem de bem elevou para sete o número dos filhos do servo de Deus. Então, esse bom pai reuniu-os a todos e falou-lhes longamente do Reino de Deus, do desprezo do mundo, da renúncia à própria vontade e da mortificação dos sentidos, e anunciou-lhes o seu projecto de os enviar aos quatro cantos do mundo. […] 

«Ide — disse com ternura aos seus filhos — e anunciai a paz aos homens; proclamai a conversão, para que obtenham o perdão dos pecados (Mc 1,4). Sede pacientes nas tribulações, assíduos na oração, corajosos no trabalho; pregai os vossos sermões com simplicidade, sede irrepreensíveis na vossa conduta e agradecidos pelos benefícios recebidos. Se cumprirdes tudo isto, será vosso o Reino do Céu (Mt 5,3; Lc 6,20)!» 

Então, humildemente de joelhos diante do servo de Deus, eles acolheram este envio na alegria espiritual que advém da santa obediência. Francisco disse a cada um: «Abandona ao Senhor todas as preocupações, e Ele te sustentará» (Sl 54,23). Esta era a sua frase habitual sempre que enviava um irmão em missão. Quanto a ele, consciente da sua vocação de modelo e querendo igualmente pôr em prática não só os seus «ensinamentos» mas também as suas «obras» (Act 1,1), levou consigo um dos seus companheiros e tomou com ele a direcção de um dos quatro pontos cardeais.

Vida de S. Francisco, «Legenda Major», cap. 3 

quinta-feira, 26 de junho de 2014

Edificados sobre a Rocha

São Gregório Nazianzeno, bispo e doutor da Igreja

Certa noite, andava eu a passear à beira-mar e, como diz a Escritura, «soprando uma forte ventania, o lago começou a agitar-se» (Jo 6,18). As vagas elevavam-se ao longe e invadiam a praia, batendo nos rochedos, desfazendo-se e transformando-se em espuma e em gotículas. Os seixos pequenos, as algas e as conchas mais leves eram arrastados pelas águas e atirados para a praia, mas os rochedos permaneciam firmes e inabaláveis, como se tudo estivesse calmo, mesmo no meio das vagas que os assolavam. […] 

Retirei uma lição desse espectáculo. Esse mar não será a nossa vida e a condição humana? Também aqui se encontra muita amargura e instabilidade. E não serão como os ventos as tentações que nos assolam e todos os golpes imprevistos da vida? Era nisso, segundo penso, que meditava David quando clamava: «Salva-me, ó Deus, porque as águas quase me submergem; estou a afundar-me num lamaçal profundo, não tenho ponto de apoio; entrei no abismo de águas sem fundo e a corrente está a arrastar-me» (Sl 69,2ss). Entre as pessoas que são postas à prova, umas parecem-me objectos ligeiros e sem vida que se deixam levar sem oferecer a mínima resistência; não têm nenhuma firmeza em si; não têm o contrapeso duma razão sábia que lute contra os assaltos. Outras parecem-me rochedos, dignas dessa Rocha sobre a qual fomos edificados e que adoramos; formadas nos raciocínios da verdadeira sabedoria, elevam-se acima da fraqueza comum e tudo suportam com uma constância inabalável. (Discurso 26)

quarta-feira, 18 de junho de 2014

Tu, quando orares, entra no quarto mais secreto e, fechada a porta, reza em segredo a teu Pai

Beato John Henry Newman (1801-1890)

Aqueles que buscam o Deus invisível buscam-No nos seus corações e nos seus pensamentos secretos, e não nas palavras barulhentas, como se Ele estivesse longe deles. Têm o costume de se retirar para onde não haja olhos humanos que os vejam; para onde, humildes e cheios de fé, podem encontrar Aquele que está «perto do seu caminho, junto do seu leito e vê todas as suas atitudes». E Deus, «que sonda os corações» (Rom 9,27), os recompensará no último dia. A oração feita em segredo, segundo a vontade de Deus, é conservada como um tesouro no seu Livro da Vida (Sl 68,29). Talvez essa oração tenha requerido uma resposta aqui na terra e não a teve? Talvez o próprio que a formulou se tenha esquecido dela e o mundo nunca tenha sabido da sua existência? Mas Deus recorda-a para sempre; e no último dia, quando os livros forem abertos (Dn 7,10; Ap 20,12), essa oração será revelada e recompensada diante do mundo inteiro. […] 

Sabemos bem que devemos estar em oração e meditação, em certo sentido, durante todo o dia (Lc 18,1); mas […] devemos rezar de maneiras determinadas a certas horas do dia? […] Mesmo que estas horas e estas fórmulas precisas não sejam absolutamente necessárias à oração privada, constituem uma grande ajuda; ou antes, Nosso Senhor ordena-nos que as façamos quando diz: «Tu, quando orares, entra no quarto mais secreto…». Até Nosso Senhor tinha momentos privilegiados para a comunhão com Deus. Os seus pensamentos eram realmente um contínuo ofício divino oferecido a seu Pai, mas além disso lemos que Ele «Se retirava para a montanha para orar» e que «passou toda a noite a orar a Deus» (Mt 14,23; Lc 6,12). 

É preciso insistir neste dever de respeitar momentos precisos para a oração pessoal e privada, porque no meio das preocupações e das tensões da vida temos muitas vezes tendência para negligenciá-la, e este dever é bem mais importante do que habitualmente o consideram mesmo aqueles que o cumprem.


sexta-feira, 30 de maio de 2014

Santa Joana D'Arc


Joana nasceu na região francesa de Lorena, em 6 de janeiro de 1412. Cresceu no meio rural, piedosa, devota e analfabeta. Assinava seu nome utilizando uma cruz. Aos treze anos, começou a viver experiências místicas. Os pais acharam que estava louca.

A França vivia a guerra dos cem anos com a Inglaterra. Os franceses estavam enfraquecidos com o rei deposto e os ingleses tentando firmar seus exércitos para tomar de vez o trono. Joana, nas suas orações, recebia mensagens que exigiam que ela expulsasse os invasores, reconquistasse a cidade de Órleans e reconduzisse ao trono o rei Carlos VII.

O rei só concordou em seguir os conselhos de Joana quando percebeu que ela realmente era um sinal de Deus. Deu-lhe a chefia de seus exércitos. Joana vestiu armadura de aço, empunhou como única arma uma bandeira com a cruz e os nomes de Jesus e Maria nela bordados, chamando os comandantes à luta pela pátria e por Deus.



Os franceses sitiados reagiram e venceram os invasores ingleses, livrando o país da submissão. Carlos VII foi então coroado na catedral de Reims, como era tradição na realeza francesa. 

Quanto a Joana, foi ferida, traída e vendida para os ingleses, que decidiram julgá-la por heresia. Num processo religioso, grotesco, completamente ilegal, foi condenada à fogueira como "feiticeira, blasfema e herética". Tinha dezenove anos e morreu murmurando os nomes de Jesus e Maria, em 30 de maio de 1431.

Vinte anos depois, o processo foi revisto pelo Papa Calisto III, que constatou a injustiça e a reabilitou. Joana d'Arc foi canonizada em 1920 pelo Papa Bento XV, sendo proclamada padroeira da França. 


Joana entrou para a história como mito. Aquela jovem camponesa de 20 anos incompletos, tendo como arma principal sua fé, tornou-se respeitada como uma grande líder. Joana D'Arc é considerada a maior heroína nacional da França. Seu nome, imagem e história estão presentes em todo o país. Mesmo tendo sido uma guerreira, ela jamais deixou de praticar sua fé em Jesus Cristo.

Fonte: Blog Catolicismo On line

quarta-feira, 26 de março de 2014

Cumprimento da Lei - São Cipriano

O cumprimento da Lei: o amor em actos

Revelar o nome de Cristo, dizer-se cristão sem seguir a via de Cristo, não será trair este nome divino e abandonar o caminho da salvação? Porque o próprio Senhor ensina e declara que quem segue os seus mandamentos entrará na vida eterna (Mt 19,17), que aquele que escuta as suas palavras e as põe em prática é um sábio (Mt 7,24), e que aquele que as ensina e a elas é conforme nos actos será chamado grande no Reino dos céus. Toda a pregação boa e sã, afirma Ele, só aproveita ao pregador se a palavra que lhe sair da boca depois se traduzir em actos. 

Ora, haverá mandamento que o Senhor mais tenha ensinado aos seus discípulos que o de nos amarmos uns aos outros com o mesmo amor com que Ele próprio os amou? (Jo 13,34; 15,12) Conseguiremos encontrar, de entre os seus conselhos conducentes à salvação e de entre os seus preceitos divinos, mandamento mais importante a ser seguido e observado? Mas como pode conservar a paz ou o amor do Senhor, aquele a quem a inveja tornou incapaz de agir como homem de paz e de coração? 

Foi por esta razão que também o apóstolo Paulo proclamou os méritos da paz e da caridade, afirmando com determinação que nem a fé nem as esmolas, nem mesmo o sofrimento do confessor da fé e do mártir lhe servirão de coisa alguma, se não respeitar os laços da caridade (1Cor 13,1-3).

São Cipriano (c. 200-258), bispo de Cartago e mártir 
A cobiça e a inveja, 12-15; CSEL 3, 427-430 

quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

Adeste Fidelis - versão em português: Cristãos, Vinde Todos



Segue a letra deste maravilhoso canto na sua versão brasileira, cantada no Tempo Litúrgico do Natal, no momento da Comunhão.

Adeste Fideles (versão brasileira)

Cristãos, vinde todos, com alegres cantos
Oh! vinde, oh! vinde até Belém.
Vede nascido vosso Rei eterno.

Oh! vinde adoremos!
Oh! vinde adoremos!
Oh! vinde adoremos o Salvador!

Humildes pastores deixam seus rebanhos
E alegres acorrem ao Rei dos céus
Nós igualmente, cheios de alegria.

Oh! vinde adoremos!
Oh! vinde adoremos!
Oh! vinde adoremos o Salvador!

O Deus invisível de eternal grandeza,
Sob véus de humildade, podemos ver.
Deus pequenino, Deus envolto em faixas!

Oh! vinde adoremos!
Oh! vinde adoremos!
Oh! vinde adoremos o Salvador!

Nasceu em pobreza, repousando em palhas,
O nosso afeto lhe vamos dar.
Tanto amou-nos! Quem não há de amá-lo?

Oh! vinde adoremos!
Oh! vinde adoremos!
Oh! vinde adoremos o Salvador!

A estrela do Oriente conduziu os Magos
E a este Mistério envolve em luz.
Tal claridade, também, seguiremos.

Oh! vinde adoremos!
Oh! vinde adoremos!
Oh! vinde adoremos o Salvador!

Fonte: Youtube -  Canal de RyuuzakiL5